ABV, concessionária de Viracopos/Campinas (SP), formaliza ao governo federal pedido para manter concessão do aeroporto, encerrando processo de relicitação do terminal após aval do TCU para a conversão do processo em um acordo amigável entre as partes, em 31.08.23


Fonte: g1 – 31/08/2023
A concessionária Aeroportos Brasil-Viracopos, que administra o Aeroporto Internacional de Viracopos (SBKP), em Campinas (SP), formalizou ao governo federal, nesta quarta dia 30, o pedido para encerramento do processo de relicitação e de se manter à frente da concessão do terminal.

Na prática, a medida é o primeiro passo para encerrar o impasse após aval do Tribunal de Contas da União (TCU) para converter o que inicialmente seria a devolução da concessão para um novo acordo financeiro entre a União e a atual gestora.

A concessionária agora aguarda a manifestação do Ministério de Portos e Aeroportos e do Tribunal de Contas da União para que o processo tenha andamento.

Na carta de formalização, a Aeroportos Brasil-Viracopos (ABV) informou que se coloca à disposição, como havia ficado definido pelo TCU, para, em conjunto com o poder público, encontrar soluções para “tratar consensualmente as controvérsias anteriores”.

Para que a repactuação contratual seja levada adiante, os ministros do TCU estabeleceram um total de 15 condicionantes que precisam ser cumpridas pelo governo e as concessionárias Aeroportos Brasil (ABV), gestora integral de Viracopos desde 2013, e a Changi, que é a concessionária do aeroporto do Galão, no RJ, desde 2014, e que também solicitou devolução do aeroporto sob concessão.

A lista do TCU inclui itens como a viabilidade de novo acordo contratual, impedimento para pedido de nova relicitação, e estudos que demonstrem a vantagem da concessão sobre nova licitação. Além disso, a decisão do TCU também vale para rodovias em que concessionários podem renegociar contratos, em vez da União precisar de nova licitação para transferir as operações para outras gestões.

A análise do TCU foi motivada por uma consulta dos ministérios de Portos e Aeroportos e de Transportes. As pastas questionaram quais seriam os critérios para fim do processo de relicitação.

O contrato de concessão de Viracopos assinado inicialmente em 2012 estabeleceu 30 anos de gestão privada e investimento na casa de R$ 9,5 bilhões ao longo das três décadas de acordo.

A decisão do TCU ocorreu após o processo ficar suspenso para vistas desde 05 de julho.

A ABV recorreu ao processo de relicitação como alternativa à crise financeira, em março de 2022, mas o processo ficou “travado” no TCU a partir do momento em que o ministro relator do caso, Vital do Rêgo, pediu um cálculo de indenização à ANAC.

Neste contexto de impasse, a ABV reuniu argumentos para mostrar que a continuidade é mais vantajosa para a operação do aeroporto. A vontade da concessionária, porém, é insuficiente porque a decisão para a medida não ser levada adiante deve ser de iniciativa do governo federal, o que foi possível após a manifestação positiva do ministro de Portos e Aeroportos, Márcio França.

O g1 conversou com dois especialistas para entender o que é de fato a solução amigável que pode colocar fim à relicitação de Viracopos e quais implicações elas têm.

O contrato de concessão prevê, em caso de quebra da concessão pelo poder concedente, que é o governo federal, a possibilidade de solução amigável, desde que a concessionária prove que reúne condições de permanecer à frente do aeroporto. A informação é do advogado Luiz Felipe Pinto Lima Graziano, especialista em concessões. De acordo com ele, no caso específico de Viracopos, não houve um descumprimento voluntário do contrato de concessão, mas sim um conjunto de fatores, “alguns alheios à concessionária”, que forçaram a opção da relicitação e inviabilizaram o cumprimento do vínculo. Além disso, o advogado afirmou que a caducidade da concessão é uma opção da União e não uma obrigação.

“Quando se considera o conjunto de variáveis existentes, é preciso que se rememore que a lógica dos contratos de concessão é a sua manutenção. A relicitação deve ser considerada como exceção, aplicável apenas quando os problemas não possam ser resolvidos de outra forma que assegure a continuidade de contratação, em verdadeira alternativa menos traumática à declaração de caducidade”, explicou.

O advogado especialista em direito público e regulatório Felipe Estefam afirmou que a lógica da relicitação é a de assegurar a continuidade da prestação dos serviços. Portanto, caso a concessionária comprove as capacidades e habilitações necessárias para dar continuidade ao empreendimento, é mais vantajoso e mais eficiente que ele mesmo continue a execução contratual. “Se assim for, será preciso desfazer o termo aditivo já firmado, bem como garantir todas as condições de habilitação do concessionário”, disse.

Antes de dar o aval para a permanência da concessionária à frente do ativo, o TCU analisou cinco pedidos de Viracopos colocados pela concessionária como essenciais para que o processo caminhe e que indicam a intenção do grupo de manter o contrato.

Entre os cinco pedidos da concessionária enviados ao TCU, está o argumento de que, em caso de realização de um novo leilão, é possível que o novo concessionário não assuma o empreendimento, ainda que pague a contribuição inicial, porque a Aeroportos Brasil, que faz a gestão do terminal desde 2012, afirma que só sairá se for completamente indenizada.

Além disso, a Aeroportos Brasil defende a qualidade da administração do terminal, que bateu recorde de passageiros em 2022, para argumentar de que seria ruim para o funcionamento do aeroporto a entrada de um novo concessionário. Os argumentos:

  • Argumento de que a viabilidade do projeto de relicitação depende do valor da indenização, tendo em vista que toda a indenização deve ser paga pelo concessionário entrante;
  • Argumento de que não há justificativa econômica para impor ao Erário o dever de quitar valor de indenização, na hipótese de o valor de outorga inicial ser inferior ao valor devido a título de indenização ao anterior contratado;
  • Argumento de que existe risco de o novo concessionário pagar a contribuição inicial e não assumir a operação do aeroporto, haja vista que a ABV somente sairá quando for integralmente indenizada;
  • Argumento sobre a excelência operacional de Viracopos, que não justificaria um processo de relicitação (Aeroporto foi eleito em 2022 o 4º Melhor Aeroporto do Mundo pela AirHelp); e,
  • Argumento de que inexiste estudo técnico que justifique a vantajosidade das condições para a relicitação, em violação à supremacia do interesse público, o princípio da legalidade e o princípio da eficiência administrativa.

O cálculo de indenização define qual valor seria pago ao atual concessionário e qual das partes envolvidas faria esse acerto em caso de relicitação. O impasse, que fez o processo não avançar, possibilitou que a concessionária reunisse argumentos para defender que um novo leilão seria mais prejudicial do que benéfico ao andamento do terminal.

A concessionária Aeroportos Brasil-Viracopos, que administra a estrutura, aguarda a análise do TCU e se apega a uma Corte Internacional Arbitral, ou seja, um uma medida extrajudicial independente para definir regras sobre as indenizações pelos investimentos realizados, além de descumprimentos de contrato pela União, segundo a concessionária.

A arbitragem teve as primeiras decisões no início de fevereiro. A concessionária fez seis pedidos de reequilíbrios contratuais, os quais entende terem sido a principal razão para a crise financeira da estrutura que forçou o processo de relicitação.

Do total dos pedidos, a corte optou pela decisão contrária à concessionária ao extinguir do processo de arbitragem o pedido de Viracopos pelo não recebimento de tarifas cargas em perdimento, que ficam no armazém do aeroporto, e determinou que isso seja acordado entre o aeroporto e a Receita Federal.

O pedido de reequilíbrio pela não implementação do “Trem de Alta Velocidade” também foi negado. Entretanto, a concessionária teve decisão favorável no que considera o tema mais importante da arbitragem, que são as discussões sobre as desapropriações, principal queixa da concessionária para os problemas financeiros.

A ANAC alega que não reequilibrou o contrato em relação às áreas do aeroporto que não foram desapropriadas porque isso estava condicionado à uma prévia demonstração por parte da concessionária de que aquele espaço seria de fato usado e, além disso, deveria ser provado um “prejuízo financeiro” efetivo com a não desapropriação.

A tese foi negada pela corte arbitral, o que aumenta a possibilidade da ABV receber um valor por este desequilíbrio no contrato. A corte ainda vai avaliar os pedidos em decisão final.

Além destas questões que tiveram a primeira decisão parcial, há ainda outros três pedidos que aguardam julgamento: reequilíbrio de tarifa de carga aérea, reequilíbrio referente à Covid-19 e um terceiro sobre multa aplicada porque a concessionária não entregou as obras no prazo estipulado.

No dia 14 de junho do ano passado, o governo federal publicou uma resolução que prorrogou em dois anos o processo de relicitação de Viracopos. À época, a votação do edital no TCU havia sido retirada de pauta justamente por conta do pedido feito à ANAC sobre as indenizações.

A relicitação foi a única a esperança da atual concessionária após a crise financeira que gerou uma dívida de R$ 2,88 bilhões – esse valor é de outorgas vencidas e dívidas com bancos que ainda vão vencer. O débito, inclusive, não está mais sob responsabilidade da concessionária porque foi incluído na arbitragem. O terminal foi o primeiro do Brasil a solicitar a devolução da concessão.

O último plano de recuperação judicial do aeroporto foi protocolado à Justiça no dia 12 de dezembro de 2019. Desta data até o dia da aprovação, em fevereiro de 2020, Viracopos e os principais credores, entre eles a ANAC e o BNDES, se reuniram para tentar chegar a um acordo e definiram que a proposta seria votada na assembleia desde que Viracopos aceitasse a relicitação.

Depois de aceita em assembleia, a recuperação judicial de Viracopos foi encerrada pela Justiça no dia 10 de dezembro de 2020. A partir disso, começou o processo de relicitação. Em agosto de 2021, a Anac aprovou o edital dela.

A concessionária já havia sinalizado a intenção de devolver a concessão em julho de 2017, mas emperrou na lei 13.448/2017, que regulamenta as relicitações de concessões aeroportuárias, ferroviárias e rodoviários do Brasil e só teve o decreto publicado em agosto de 2019.