ANAC abre duas consultas públicas sobre proteção de dados de segurança operacional e programa de reporte mandatório, com propostas de normativos elaboradas no âmbito dos programas PSO-BR e do PSOE-ANAC, em 10.02.22
A ANAC divulgou que instaurou duas consultas públicas, nº 03/2022 e nº 04/2022, para receber contribuições sobre a elaboração de novos normativos com foco no recebimento de reportes voluntários e mandatórios relacionados à segurança operacional.
As minutas sob consulta pública são ações do Programa Brasileiro para a Segurança Operacional da Aviação Civil (PSO-BR) e do Programa de Segurança Operacional Específico (PSOE-ANAC), programas empreendidos pela ANAC, e têm como objetivo implementar os mecanismos de coleta, tratamento, proteção e compartilhamento necessários às informações de segurança operacional enviados à agência.
Adicionalmente, para incentivar o compartilhamento e resguardar as informações decorrentes dos relatos, bem como estabelecer critérios gerais para a coleta, tratamento e compartilhamento dos dados e informações de segurança operacional, a ANAC também disponibilizou, para contribuição de toda a sociedade, minuta de norma que estabelece a Política de Proteção de Dados e Informações de Segurança Operacional no âmbito de competência da agência. A proposta de Política de Proteção, que consta da Consulta Pública nº 04/2022, estabelece de forma clara os princípios de proteção e de exceção aplicáveis aos dados e informações de segurança operacional de forma a normatizar o seu uso exclusivo para fins de melhoria da segurança operacional, protegendo-os quanto à divulgação ao público e a punição por parte da ANAC, desde que não representem condutas inaceitáveis do ponto de vista da cultura justa.
A proposta de resolução da Consulta Pública nº 03/2022 tem por objetivo tornar mais claros quais eventos devem ser reportados de forma mandatória à ANAC, e o prazo para envio do relato.
Na justificativa para a minuta proposta, a ANAC argumenta que o desenvolvimento da proposição de resolução foi pautado na Portaria Conjunta nº 5.754, de 23/08/2021, que dispõe sobre o Sistema de Reporte para a Aviação Civil Brasileira, servindo como marco nacional para a definição da lista de ocorrências que devem ser reportadas e para que a ANAC e o Comando da Aeronáutica (COMAER) revisem ou estabeleçam procedimentos a serem observados na comunicação, mandatória ou voluntária, de eventos relacionados com a segurança operacional e que ponham em perigo ou, caso não sejam corrigidos ou solucionados, que possam pôr em perigo uma aeronave, os seus ocupantes ou outras pessoas, incluindo-se as “ocorrências aeronáuticas” definidas na NSCA (Norma do Sistema do Comando da Aeronáutica) 3-13, de Protocolos de Investigação de Ocorrências Aeronáuticas da Aviação Civil Conduzidas pelo Estado Brasileiro”, mas não se limitando a esse tipo de eventos.
Por sua vez, a Portaria Conjunta nº 5,754 é um dos frutos do esforço do Comitê de Segurança Operacional da Aviação Civil Brasileira, instituído pelo Decreto nº 9.880, de 27/06/2019, e que tem como objetivo estabelecer e monitorar o nível aceitável de desempenho de segurança operacional do país e deliberar sobre os indicadores de segurança operacional da aviação civil brasileira, além de implementar o Programa Brasileiro para a Segurança Operacional da Aviação Civil (PSO-BR) e as medidas necessárias à melhoria da segurança operacional da aviação civil brasileira.
Ou seja, a proposta de resolução ora submetida à Consulta Pública, além de representar uma modernização do sistema de reportes da aviação civil brasileira, endereçando ações recomendadas pela OACI por ocasião de auditoria realizada no país em março de 2018, também suporta a implementação do SDCPS (Safety Data Collection and Processing System) do Brasil, encontrando alinhamento com o Anexo 19 à Convenção de Aviação Civil Internacional, o DOC 9859 – Safety Management Manual (manual de gerenciamento de segurança), os programas PSO-BR (Programa Brasileiro para a Segurança Operacional da Aviação Civil) e PSOE-ANAC (Programa de Segurança Operacional Específico da ANAC), e modelos implementados por outras autoridades de aviação civil estrangeiras, notadamente o modelo europeu.
Tendo em vista a adoção do modelo europeu como referência, a proposta de resolução foi desenvolvida a partir da lista de ocorrências de reporte mandatório estabelecidas através do Commission Implementing Regulation (EU) 2015/2018 que complementa o Regulation (EU) 376/2014, ambos da agência-autoridade de segurança da aviação européia (EASA).
Entretanto, foram realizados ajustes na lista de ocorrências (Anexo I da proposta de resolução) para adequação ao contexto nacional. Por exemplo, os títulos atribuídos aos grupos de ocorrências foram ajustados para melhor clarificar qual o “ator” do sistema de aviação civil é o responsável por efetivar o reporte daquelas ocorrências. Também pode ser destacada a adequação no agrupamento de aeronaves, uma vez que não há definição de “aeronaves de alta complexidade” nos normativos nacionais e para não criar novas definições que possam vir a conflitar com outros normativos da ANAC, atuais ou futuros.
Além disso, embora no normativo da EASA exista a previsão de reportes mandatórios a serem realizados diretamente por empresas prestadores de serviços auxiliares em aeródromos (ESATAS), as ocorrências previstas na seção específica foram ajustadas para serem reportadas diretamente pelos operadores aéreos e/ou operadores de aeródromos, considerando que a terceirização dos serviços auxiliares é uma decisão de modelo de negócio empresarial e não função da estrutura normativa adotada pela ANAC.
Os fundamentos técnicos que embasaram o texto proposto encontram-se pormenorizados na Nota Técnica nº 17/2021/ASSOP, mas vale destacar que o objetivo primário da resolução proposta é contribuir para o desenvolvimento de uma cultura de segurança operacional madura, na qual exista a confiança por parte da comunidade de aviação civil em compartilhar informações de segurança operacional com a autoridade de aviação civil.
Dessa forma, as informações compartilhadas com a ANAC serão utilizadas exclusivamente com o objetivo de incremento da segurança operacional, e esta iniciativa não visa ser um mecanismo de captação de recursos por meio de autos de infração, sendo previsto que os reportes gozação dos benefícios da Política de Proteção de Dados e Informações de Segurança Operacional da ANAC, também apresentada para consulta pública.
A aplicação de penalidades é prevista, apenas, quando do descumprimento da obrigação de reportar no prazo definido e, ainda assim, a proposta de resolução incorpora períodos de carência e flexibilidade para a aplicação de sanções pecuniárias, viabilizando a adoção de medidas de caráter educacional mais apropriadas para o desenvolvimento de uma cultura colaborativa. Ainda, também é proposto que os valores das sanções sejam proporcionais ao tipo de regulado e/ou de serviço prestado (Anexo II da proposta de resolução).
Por fim, a justificativa da ANAC ressalta que os regulados continuam obrigados a manter o envio dos reportes mandatórios na forma atualmente estabelecida na regulamentação em vigor, independente do período entre a consulta pública e a entrada em vigor do texto final da resolução, que poderá ser fruto de posterior deliberação da Diretoria Colegiada da ANAC. O mesmo se aplicará durante o vacatio legis (expressão latina que significa “vacância da lei”), previsto no Art. 6º da proposta.
Por sua vez, a minuta relativa ao Programa de Notificação de Desvios da Consulta Pública n° 04/2022 tem como premissa estabelecer um novo mecanismo de aprimoramento da “Cultura Positiva”, conceito definido na Política de Proteção de Dados e Informações de Segurança Operacional proposta, de forma a contribuir para o desenvolvimento de um ambiente colaborativo na aviação civil brasileira.
Na justificativa para a minuta proposta, a ANAC argumenta que o desenvolvimento da proposição foi pautado foi pautado no Anexo 19 à Convenção de Aviação Civil Internacional, no DOC 9859 – Safety Management Manual (manual de gerenciamento de segurança), os programas PSO-BR (Programa Brasileiro para a Segurança Operacional da Aviação Civil) e PSOE-ANAC (Programa de Segurança Operacional Específico da ANAC), e nas discussões que resultaram na publicação da Portaria Conjunta nº 5.754, de 23 de agosto de 2021, que dispõe sobre o Sistema de Reporte da Aviação Civil Brasileira, e em avaliações de modelos implementados por outras autoridades de aviação civil estrangeiras.
A Política de Proteção de Dados e Informações de Segurança Operacional proposta é um documento de alto nível, com o objetivo de definir conceitos, princípios e critérios gerais para a coleta, tratamento e compartilhamento de dados e informações de segurança operacional por parte da ANAC.
Os fundamentos técnicos que embasaram o texto proposto encontram-se pormenorizados na Nota Técnica nº 15/2021/ASSOP, abaixo sendo um resumo dos referidos fundamentos técnicos:
- Capítulo I – das Disposições Gerais: neste capítulo é proposta definição para “Dados de Segurança Operacional” e “Informações de Segurança Operacional”, conforme os conceitos estabelecidos no Anexo 19. Também é proposta definição para “Mecanismos de aprimoramento da Cultura Positiva” com o objetivo de estabelecer um ambiente para criação de instrumentos, processos e normativos específico para incentivar o compartilhamento de dados e informações de segurança operacional com as garantias previstas na política de proteção. À título de exemplo, destaca-se que podem ser considerados como mecanismos dessa natureza os Grupo Brasileiros de Segurança Operacional (BAST) e o próprio Programa de Notificação de Desvio, cuja proposta é apresentada conjuntamente na Consulta Pública.
- Capítulo II – dos Objetivos: este capítulo define, como objetivos da Política de Proteção de Dados e Informações no âmbito da ANAC, o estabelecimento de diretrizes para proteção desses dados e informações, o estímulo ao recebimento e compartilhamento desses dados e informações com o setor regulado e outras autoridades de aviação civil, e a contribuição para o desenvolvimento de ambiente de confiança e estímulo à Cultura Positiva de Segurança Operacional.
- Capítulo III – dos Princípios: buscando compatibilizar os princípios balizadores para a criação de um ambiente de confiança entre autoridades e setor regulado apresentados no Anexo 19, com o ordenamento jurídico nacional e as particularidades do nosso país, esse capítulo estabelece o Princípio da Proteção e o Princípio da Exceção. Se por um lado o Princípio da Proteção protege os dados e informações de segurança operacional quanto à divulgação ao público e quanto ao uso para finalidades diferentes da manutenção e melhoria da segurança operacional, por outro o Princípio da Exceção estabelece situações em que essa proteção deixa de ser garantida.
- Capítulo IV – da Proteção de Providências Administrativas Preventivas e Sancionatórias: este capítulo estabelece que os dados e informações de segurança operacional obtidos por meio dos Mecanismos de Aprimoramento da Cultura Positiva não serão utilizados pela ANAC para fins de aplicação de medidas sancionatórias, desde que atendidos os critérios estabelecidos nos respectivos normativos específicos (relacionados ao Princípio da Exceção). Esclarece-se que essa proteção não atinge os dados e informações recebidas ou geradas pela ANAC em decorrência de atividades de fiscalização, tampouco limita a adoção de providências administrativas acautelatórias por parte da ANAC.
- Capítulo V – da Proteção de Divulgação: este capítulo estabelece a garantia da confidencialidade da identidade dos autores das comunicações e das pessoas referidas para reforçar a o ambiente de confiança necessário para o compartilhamento de dados e informações de segurança operacional com a ANAC, de forma que os dados e informações somente serão compartilhados com finalidade específica de melhoria do desempenho de segurança operacional. É válido ressaltar que a proposta levou em considerações os aspectos da Lei nº 13.709, de 14/08/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais – LGPD), da Lei nº 12.527, de 18/11/2011 (Lei de Acesso à Informação), do Decreto nº 10.046, de 09/10/2019, e de outros normativos complementares e normas internas da ANAC.
Em linhas gerais, a Política de Proteção de Dados e Informações de Segurança Operacional contribui para o atendimento do disposto nos Arts. 74 e 75 do PSOE-ANAC que, dentre outras questões, prevêem a necessidade de estabelecimento de mecanismos de sigilo e de proteção de dados e informações coletadas pela ANAC através de relatos (reportes) mandatórios, relatos voluntários, dados e informações oriundos de ocorrências aeronáuticas e eventos de segurança operacional, dados e informações compartilhados através de iniciativas em colaboração com a indústria da aviação civil, e de outras fontes que a ANAC julgar adequadas para o aprimoramento dos processos da garantia da segurança operacional e da segurança operacional propriamente dita.
Quanto ao Programa de Notificação de Desvios no âmbito da ANAC, a resolução para estabelecimento do Programa de Notificação de Desvios é um documento complementar à Política de Proteção de Dados e Informações de Segurança Operacional que propõe a criação desse programa como um Mecanismos de Aprimoramento da Cultura Positiva, consequentemente, com as proteções quanto à divulgação ao público e quanto ao uso para finalidades diferentes da manutenção e melhoria da segurança operacional, incluindo-se a proteção contra o uso pela ANAC para fins de aplicação de medidas sancionatórias, desde que atendidos os critérios estabelecidos e relacionados ao Princípio da Exceção.
Nos termos da proposta, a Notificação de Desvio é a comunicação voluntária de fato próprio que evidencie um descumprimento de requisitos normativos que tenha gerado ou possa gerar riso à segurança operacional. E, por se tratar de um tipo de relato voluntário, o Art. 74 do PSOE-ANAC prevê que devem ser estabelecidos os mecanismos de proteção para a criação do Programa de Notificação de Desvios que tem o intuito de contribuir para o desenvolvimento de um ambiente de Cultura Justa na Aviação Civil Brasileira.
Em linhas gerais, a Resolução proposta, além de estabelecer o Programa de Notificação de Desvios como um Mecanismo de Aprimoramento da Cultura Positiva, também estabelece alguns critérios adicionais ao Princípio da Exceção (definido na Política de Proteção de Dados e Informações de Segurança Operacional), para garantia da proteção contra providências administrativas preventivas e sancionatórias por parte da ANAC.
Os fundamentos técnicos que embasaram o texto proposto também se encontram registrados na Nota Técnica nº 15/2021/ASSOP e se destaca que a proposta foi preparada considerando-se o disposto no Anexo 19, no DOC 9859, no PSOE-ANAC, e em programas de reporte voluntário já estabelecidos por outros órgãos nacionais ou autoridades de aviação Civil estrangeira como, por exemplo, o Reporte ao CENIPA para Segurança de Vôo (RCSV), o sistema de reportes voluntários do Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA), os norte-americanos ASRS – Aviation Safety Report System (sistema de reporte de segurança da aviação), ASAP – Aviation Safety Action Program (programa de ação de segurança da aviação) e VDRP – Voluntary Disclosure Reporting Program (programa de reporte de divulgação voluntária), e o sistema de reporte europeu estabelecido pela Regulation (EU) 376/2014 e pela Regulation (EU) 2018/1139.
Por fim, a justificativa da ANAC esclarece que neste primeiro momento, é proposta a criação do Programa de Notificação de Desvios para receber relatos voluntários de organizações certificadas pela ANAC, apenas, sendo possível a expansão do modelo para profissionais da aviação civil no futuro.
Além de representar uma modernização do sistema de reportes da aviação civil brasileira, implementando ações recomendadas pela Organização de Aviação Civil Internacional (OACI), as duas propostas apresentadas estão alinhadas com os modelos praticados por autoridades de aviação civil estrangeiras, em especial as regras estabelecidas pela Agência Européia para a Segurança da Aviação (EASA).
As minutas dos normativos e as justificativas do projeto estão disponíveis para acesso na página Consultas Públicas, no site da ANAC:
https://www.gov.br/anac/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-social/consultas-publicas/consultas-publicas-em-andamento/consulta-publica