Fabricantes de motores focadas em pesquisa e desenvolvimento para a propulsão da aviação do futuro e, simultaneamente, aprimorando os produtos atuais em serviço, inclusive para sanar deficiências de durabilidade de projeto original, em 20.07.23


Em artigo postado em 17/06/2023 na mídia AIN – “Upbeat engine OEMs focus on R&D for Tomorrow” (ou, Fabricantes de motores motivadas focadas em pesquisa e desenvolvimento para o Amanhã), Chris Kjelgaard faz um repasse do atual momento das grandes fabricantes de motores aeronáuticos – Rolls-Royce, CFM International, GE Aerospace e Pratt & Whitney, quanto aos atuais programas de motores em serviço e ainda quanto a seus projetos de propulsão de nova geração para a aviação do futuro.

Com o tráfego de passageiros se recuperando fortemente à medida que a pandemia de Covid-19 recua, Rolls-Royce, CFM International, GE Aerospace e Pratt & Whitney tiveram vendas ‘saudáveis’ de suas famílias de motores para aeronaves comerciais, aponta Kjelgaard iniciando o seu artigo.

Mas, mesmo enquanto tentam recuperar a produção para os níveis de 2018 e 2019 em meio a uma luta para superar gargalos e até interrupções de longo prazo na cadeia de suprimentos envolvendo materiais e peças críticas, todas as quatro fabricantes estão comprometidas em conduzir pesquisa e desenvolvimento (R&D) para garantir que suas linhas de produtos atendam às exigências da indústria de transporte aéreo, com a meta de emissões líquidas zero de carbono para 2050. 

Rolls-Royce apontada para 2035
Conforme Kjelgaard, a fabricante britânica Rolls-Royce continua fortemente focada no futuro de longo prazo do setor aéreo, a partir de 2035, quando o SAF, propulsão a hidrogênio e energia elétrica participarão da obtenção de desempenho líquido zero de carbono, de acordo com declaração de Alan Newby, diretor de tecnologia aeroespacial e programas futuros da RR.

Newby disse para a AIN que, até o final de 2023, “praticamente toda” a linha de motores turbofan de grande porte da Família (atual) Trent estará certificada para operar comercialmente usando combustível 100% SAF. Mas a Rolls-Royce também acredita que “o hidrogênio desempenhará um papel fundamental na descarbonização do mundo”.

A pesquisa da Rolls-Royce indicou que o hidrogênio líquido pode vir substituir o SAF como combustível para operações de curto alcance em aeronaves a jato regionais e até mesmo jatos de fuselagem estreita/corredor único, embora os vôos de longo alcance de grandes aeronaves continuem a precisar de combustível fóssil (Jet-A) indefinidamente. Embora o hidrogênio líquido pese menos que o combustível de aviação, sua densidade de energia muito menor requer tanques de combustível muito maiores do que os de qualquer combustível convencional ou SAF puro.

Além disso, Newby revelou, a temperatura de -253°C necessária para manter o hidrogênio na forma líquida, além da necessidade de aquecê-lo para um gás de temperatura ambiente para combustão, tornará o gerenciamento de calor a bordo e a infraestrutura de bombeamento para hidrogênio líquido combustível algo complexo e pesado.

Em um dos vários programas de pesquisa e desenvolvimento de propulsão a hidrogênio em que está envolvida, a Rolls-Royce e 25 parceiros estabeleceram uma plataforma no aeroporto de Cranfield para testar a integração de um sistema de provisão de combustível de hidrogênio embarcado com um motor e uma nacele. As muitas áreas de teste que a plataforma conduzirá incluem o gerenciamento do projeto de combate a incêndio e as capacidades de drenagem de combustível de hidrogênio.

Newby disse que, em outra pesquisa de propulsão a hidrogênio em que a fabricante de motores britânica faz parceria com o instituto aeroespacial alemão DLR, a Rolls-Royce Deutschland está projetando arquiteturas de injetores de combustível para testes em uma plataforma que o DLR desenvolveu para testar sistemas de combustível de hidrogênio.

Enquanto isso, sob o Projeto “Napkin”, um programa no qual a Rolls-Royce faz parceria com a transportadora aérea britânica easyJet, teste em novembro passado, em Boscombe Down, no Reino Unido, operou um motor turboélice AE-2100 – que equipa o transportador Lockheed C-130 – usando hidrogênio verde como combustível.

“Só precisamos trocar os injetores de combustível” para realizar a corrida no solo com sucesso, disse Newby. “Estamos até conduzindo testes de emissões [do banco de testes AE-2100 movido a hidrogênio] – há trabalho necessário para otimizá-lo para minimizar as emissões de monóxido de carbono (NOx)”, falou Newby.

Enquanto isso, a Rolls-Royce continua a desenvolver sua nova arquitetura de turbofan UltraFan com engrenagem (caixa de redução); a fabricante anunciou em 18 de maio que havia concluído com sucesso as primeiras corridas em solo de seu demonstrador UltraFan de 140 polegadas (355,6 cm) alimentado por combustível 100% SAF.

Os futuros testes da plataforma de propulsão UltraFan incluirão o uso de combustível de hidrogênio e arquiteturas de propulsão “mais elétricas”, disse Newby. Os testes incluem o uso de “micro-hibridização”, na qual quantidades relativamente pequenas de energia elétrica impulsionarão cada motor à turbina a gás movido a JET-A [QAv] “para melhorar seu desempenho em todo o envelope de vôo”, nas informações prestadas por Newby.

Os muitos projetos de propulsão a hidrogênio em fase de pesquisa e desenvolvimento nos quais a Rolls-Royce está envolvida culminarão com o teste em solo de um turbofan Pearl 15 modificado para usar hidrogênio “verde” como combustível. A Rolls-Royce – em parceria com a easyJet – iniciará posteriormente os testes de vôo do motor.

“A Rolls-Royce implementará um programa de tecnologia a tempo de iniciar a produção [de motores movidos a hidrogênio] … para quando os fabricantes quiserem os motores para suas aeronaves”, disse Newby. “Dado que precisamos de tempo de espera para um programa de produção, precisaremos ter a tecnologia madura pronta para o final desta década”, completou Newby.

Pratt & Whitney aborda fontes de energia híbrida e por hidrogênio
Juntamente com a “empresa-irmã” Collins Aerospace, a fabricante canadense Pratt & Whitney (P&W) está desenvolvendo um sistema de propulsão híbrido-elétrico e movido à turbina a gás. O motor de demonstração completou sua primeira corrida no solo em Québec, no Canadá, em dezembro, e as parceiras planejam começar a testar o sistema em vôo em 2024.

Paralelamente, sob um contrato do Departamento de Energia (DoE) do EUA, a P&W começou a desenvolver o motor à turbina com injeção de vapor de hidrogênio e resfriamento intermediário (HySIITE). Esse motor usará combustão de hidrogênio líquido e recuperação de vapor de água para atingir zero emissões de CO2 em vôo em futuras aeronaves de fuselagem estreita/corredor único, reduzindo as emissões de NOx em até 80% e o consumo de combustível em até 35%.

A Família de motor turbofan GTF já acumulou 21 milhões de horas de vôo e conquistou pedidos e compromissos para mais de 10.000 motores.

“Agora atingimos o nível alvo de confiabilidade de despacho, que está em níveis maduros”, disse Dave Emmerling, vice-presidente do programa GTF Engines, da P&W. “Melhoramos o tempo de asa desde o início do programa e continuamos a fazê-lo com atualizações em blocos em andamento em todas as nossas variantes GTF e no programa de versão evoluída GTF Advantage”, disse Emmerling.

O GTF Advantage – uma grande atualização da unidade PW1100G que equipa a Família A320NEO – acumulou 2.800 horas e 8.200 ciclos de testes de solo e vôo em seu programa de validação ao longo de dois anos. Destinado a obter um ganho de eficiência de 1% em relação ao atual (original) PW1100G, o programa Advantage inclui testes de resistência extensivos para fornecer confiabilidade madura na entrada em serviço, disse Emmerling. “O programa de teste foi projetado com atenção especial para operações em ambientes severos. Isso inclui resistência de seção quente, acúmulo cíclico rápido e ingestão de sujeira”, explicou Emmerling.

Isso será importante porque muitos motores GTF – especialmente aqueles operados principalmente em ambientes quentes e hostis – tiveram problemas de durabilidade e implicações para redução de peso de decolagem e uma escassez severa de peças sobressalentes causadas pela cadeia de suprimentos. Os problemas paralisaram muitas aeronaves equipadas com motor GTF operadas por várias cias. aéreas e, em abril, levaram a transportadora aérea indiana de A320 Go First a uma crise financeira ao ponto de declaração de falência e a processar a P&W por uma indenização de US$ 1 bilhão.

As ações corretivas da P&W incluem “a incorporação de atualizações de durabilidade para aumentar o tempo entre as remoções do motor, especialmente em ambientes quentes e hostis”, disse Emmerling. “Estamos apresentando hardware de combustor mais durável para nossos clientes. Hoje, mais de 50% da Família A320NEO equipada com GTF possui a atualização mais recente e prevemos que a maior parte da frota a terá nos próximos anos”, completou Emmerling.

GE Aerospace: turbofan GEnx domina a classe
Embora a produção em volume do turbofan de grande porte GEnx-2B, que equipa os jatos de fuselagem larga Boeing 747-8 tenha terminado, a GE Aerospace continua a ver uma forte demanda pelo GEnx-1B, que equipa outro modelo widebody Boeing 787, de acordo com Kathy MacKenzie, presidente e CEO das operações de motores comerciais da GE Aerospace.

Cerca de 2.400 motores GEnx entraram em serviço e a GE tem pedidos para mais 520, quase todos da variante GEnx-1B. Com a Família concorrente Rolls-Royce Trent 1000 tendo sofrido problemas relacionados a erros/falhas de produção alguns anos atrás, o GEnx-1B agora domina o mercado. “Temos centenas de oportunidades de campanha [de vendas]”, disse MacKenzie para a AIN.

MacKenzie disse que a GE Aerospace planeja não introduzir outro grande ‘pacote’ de atualização do GEnx nos próximos dois anos. “Estaremos tentando avançar em nosso próximo conjunto de tecnologias [durante esse período]” desenvolvido a partir da participação da GE no enorme programa RISE, da CFM, em estágeio de pesquisa e desenvolvimento. “Avaliaremos trazer essas melhorias de volta aos nossos motores existentes”, acrescentou MacKenzie.

Enquanto isso, de acordo com MacKenzie, os pedidos – e novas serviços em oficinas de MRO – para o já legado grande turbofan CF6-80, que equipa o modelo Boeing 767-300F (versão cargueira ainda em produção) continuam a crescer. O programa Boeing 767-300F segue com encomendas robustas.

As vendas também permanecem saudáveis para o turbofan de grande porte GE90-110B, que equipa a variante cargueira em produção Boeing 777F. As vendas da Família GE90 até o momento ultrapassam 3.000 unidades.

MacKenzie disse que a GE Aerospace também continua vendo uma forte demanda de novos pedidos para sua família de turbofan de médio porte CF34, cujas unidades-variantes equipam os jatos regionais EMBRAER E175 e COMAC ARJ-21-700.

Separadamente, a GE Aerospace interrompeu temporariamente sua participação no programa de testes de vôo para o Boeing 777X, do motor GE9X, em 2022, quando, durante os testes de maturação e validação em suas instalações de teste de solo em Peebles, no Ohio (EUA), descobriu que uma peça de seção quente não demonstrou a resposta de desempenho esperada, de acordo com MacKenzie.

No entanto, disse MacKenzie, a GE criou rapidamente uma melhoria de design incorporada em todos os motores GE9X de teste, e o motor afetado voltou ao teste de vôo em 10 semanas. A GE Aerospace agora está “tentando alinhar a melhoria” para incorporação em todos os motores GE9X da linha de produção.

CFM: motor LEAP dá um salto em vendas para novas “alturas”
A CFM International, uma joint venture (associação) 50%-50% entre a americana GE Aerospace e a francesa Safran Aircraft Engines, acumulou pedidos e outros compromissos para cerca de 21.000 motores turbofan de aeronaves comerciais LEAP, tornando-se a família de motores a mais vendida da história, de acordo com Gaël Méheust, presidente e CEO da CFM.

Méheust observou que os motores da Família LEAP acumularam mais de 30 milhões de horas de vôo até meados de maio, atingindo uma taxa de utilização de 92,5%. Os motores com maior tempo de operação acumulada já registraram 18.000 horas de vôo em asa e 10.000 ciclos de vôo desde a entrada em serviço há apenas sete anos.

A Família de motores turbofan LEAP está demonstrando melhorias na eficiência de combustível em serviço na faixa de 15 a 20% em relação a seus antecessores diretos, principalmente a Família CFM56, disse Méheust.

A CFM experimentou um problema de durabilidade com os motores LEAP-1A e LEAP-1B operados por cias. aéreas que operam principalmente em condições quentes e adversas, principalmente no Oriente Médio. O problema de durabilidade resultou de uma combinação de temperatura externa elevada (calor) e ingestão de areia (suspensa no ar), causando desgaste prematuro nos bicos da turbina de alta pressão (HPT – high-pressure turbine) e nas pás (blades) da turbina de alta pressão.

Méheust revelou que, para encontrar uma solução permanente, a CFM construiu um equipamento de teste de solo exclusivo que duplica as condições exatas de ingestão de areia e temperatura externa que levaram aos problemas de durabilidade. O teste de equipamento das peças HPT relevantes viu as peças com os mesmos problemas enfrentados pelos motores em serviço. No entanto, quando testados na plataforma, os bicos e lâminas HPT redesenhados não apresentaram desgaste. “Portanto, sabemos que a correção funcionará e estamos confiantes de que será bem-sucedida”, disse Méheust. “Agora é uma questão de tempo até que o LEAP se comporte como o [ultraconfiável] CFM56 no Oriente Médio”, disse Méheust.

Enquanto isso, o o programa do motor CFM56 continua sendo o motor turbofan mais vendido do mundo. A CFM entregou cerca de 34.000 motores e a Família registrou mais de 1,2 bilhões de horas de vôo em serviço. O CFM56-7B equipa a Família Boeing 737NG e responde por 500 milhões de horas do total (cerca de 40%). Cerca de 22.000 a 23.000 motores CFM56 permanecem em serviço e a Família CFM56 acumula um milhão de horas de vôo adicionais todas as semanas e continua com uma média de confiabilidade de despacho de 99,98%. 

Programa RISE visa salto gigantesco de eficiência
A GE Aerospace e a CFM continuam altamente focadas no programa RISE, em estágio de pesquisa e desenvolvimento, liderado pela CFM, que Gaël Méheust, presidente e CEO da CFM, descreveu como “o programa de aquisição e maturação de tecnologia mais abrangente da história da CFM”.

As duas fabricantes-parceiras da joint venture da CFM – a GE e a Safran – dedicaram mais de 1.000 engenheiros ao programa RISE. De acordo com Méheust, as fabricantes (GE e Safran) viram o programa RISE fazer “um bom progresso” por meio da maturação precoce da tecnologia. “Estamos passando de testes de peças e componentes para começar a testar subsistemas”, disse Méheust. “Estamos a caminho de testar no solo uma demonstração do Open Fan (rotor aberto) em algum lugar em 2026-2027”, completou Méheust.

Os testes posteriores dos demonstradores da tecnologia RISE testarão 100% SAF e hidrogênio como combustíveis para a configuração do motor Open Fan (rotor aberto) e, para qualquer outra configuração de motor, a CFM decidiu explorar dentro do RISE. “O SAF é algo não-inteligente. SAF 100% já foi testado com sucesso no LEAP-1B”, explicou Méheust.

O teste de combustível de hidrogênio, no programa RISE, pela CFM se baseará na parceria da joint venture com a fabricante francesa Airbus para testar em vôo, em um A380, um motor turbofan GE Passport modificado pela CFM para usar combustível de hidrogênio, montado na fuselagem traseira do A380. A Airbus fornecerá o armazenamento do tanque e o sistema de fornecimento de hidrogênio ao motor. [EL] – c/ fonte