“Portas secundárias” serão de uma cela voadora? – por Matt Thurber


No dia 27, o editor da AIN, e piloto detentor de Licença PLA, Matt Thurber escreveu um artigo postado na online da mídia sobre a segurança de cabine de comando, e questão de controle de acesso de pessoal. O artigo tem título “Will secondary doors be a flying jail cell? – Flight deck security continues to be an issue and doesn’t seem to acknowledge safety concerns”, traduzido em Portas secundárias” serão de uma cela voadora? – a segurança de cabine de comando continua sendo um problema e parece não reconhecer as preocupações com a segurança.

“Já tivemos duas situações em que portas trancadas da cabine de comando resultaram em um acidente ou quase permitiram que um acidente acontecesse. E novos requisitos verão portas secundárias ainda mais complexas, que podem ser usadas em futuros problemas. A única maneira de resolver isso é colocar um banheiro dentro da cabine de comando e abrir ‘janelas’ nas portas para que os comissários de bordo possam entregar comida para os pilotos. 

Espere um minuto — agora estamos falando de uma cela voadora. 

Essa questão está vindo à tona não apenas por causa do acidente do A320 da Germanwings em 24 de março de 2015, quando o copiloto trancou o comandante do lado de fora da cabine de comando e, em seguida, derrubou o avião, matando todas as 150 pessoas a bordo. Nem é por causa do incidente com Airbus A321 da Lufthansa em 17 de fevereiro de 2024, em que o comandante deixou a cabine de comando para ir ao banheiro e o copiloto perdeu a consciência por 10 minutos. Nesse incidente, o comandante não conseguiu abrir a porta devido a vários recursos complexos de projeto que visam impedir que pessoas mal-intencionadas invadam a cabine de comando. A porta só se abriu quando o copiloto recuperou a consciência e liberou um interruptor para permitir o acesso do comandante. 

Esta questão está em pauta agora porque a Associação de Pilotos de Linha Aérea (ALPA) está chateada com o fato de a associação comercial das companhias aéreas, Airlines for America (A4A), ter solicitado à FAA um atraso de dois anos na implementação dos novos regulamentos exigidos pela Seção 336 da Lei de Reautorização da FAA de 2018. Essa legislação determinou a instalação de barreiras secundárias na cabine de comando em aeronaves americanas. 

Na reautorização, a Lei Saracini de Segurança da Aviação, nomeada em homenagem a um dos pilotos de um avião sequestrado que terroristas lançaram contra a Torre Sul do World Trade Center em 11 de setembro [de 2001], solicitou que a FAA constituísse um comitê de regulamentação e, em seguida, emitisse uma regra final determinando a instalação de barreiras secundárias em aeronaves novas e existentes. 

O presidente da ALPA, Jason Ambrosi, emitiu a seguinte declaração sobre o atraso da FAA:

“A ALPA há muito defende a instalação de barreiras secundárias na cabine de comando e teve orgulho de liderar a iniciativa de promulgar uma legislação que implemente esse aprimoramento crítico de segurança. As companhias aéreas tiveram dois anos para implementar esses requisitos, mas agora estão solicitando uma extensão do mesmo prazo que lhes foi concedido pela regra final. Instamos a FAA a rejeitar essa mais recente tática de paralisação e implementar, sem demora, a exigência de barreira secundária, conforme determinado pelo Congresso”. 

De acordo com a petição: “A Airlines for America solicita isenção para que seus membros operem aeronaves em todo o mundo sem que a tripulação de vôo implante uma barreira física secundária instalada (IPSB) [Installed Pysical Secondary Barrier], de acordo com [FAR] 121.313(l), 121.401(a) e 121.584(a)(3), até que os operadores tenham concluído o treinamento necessário de todo o pessoal envolvido. Durante esta isenção, os procedimentos existentes serão utilizados pelas tripulações de vôo, mantendo um nível equivalente de segurança”. 

À luz do acidente da Germanwings e do incidente da Lufthansa, este adiamento parece fazer sentido. Não tenho idéia de como essas portas e barreiras secundárias funcionam; provavelmente são informações ultrassecretas e essenciais. Treinamento extensivo e prática de cenários serão necessários. 

Mas está claro que, durante o vôo da Lufthansa, a complexidade de apenas um mecanismo de porta na cabine de comando foi suficiente para confundir o comandante, que estava em plena condição, e teve que esperar que o copiloto recuperasse a consciência suficiente para que a porta fosse aberta. Quais cenários são prováveis ​​quando temos dois mecanismos complexos sujeitos às fragilidades humanas? 

A meu ver, existem apenas duas soluções para este problema.  

Uma delas são aviões automatizados. Sem pilotos, não haverá necessidade de uma ou mais portas na cabine de comando, porque não haverá cabine de comando. 

Na ausência de automação total, teremos que trancar os pilotos em suas celas voadoras e enviar comida e bebida em intervalos adequados, torcendo para que seu único banheiro não redundante não entupa. 

Adicionar complexidade a um sistema complexo não é uma boa engenharia e frequentemente traz consequências indesejadas. É claro que entendo o desejo de tornar impossível a invasão da cabine de comando por terroristas. Podemos confiar no fato de que os pilotos não devem abrir a(s) porta(s), independentemente do que esteja acontecendo do outro lado da(s) porta(s)? Essa é uma pergunta difícil de responder e, no ato que tornou obrigatórias as portas secundárias, o Congresso tentou avaliar o custo-benefício de outro ataque terrorista a bordo de um avião em comparação com a tentativa de impedir tal ataque.

“Ao considerar os custos potenciais de um grande evento terrorista, como demonstrado pelos ataques de 11 de setembro, e os benefícios potenciais de interromper ou dissuadir tal ocorrência, é difícil avaliar a probabilidade de um ataque em larga escala ou avaliar de forma independente o grau em que uma única medida, como uma barreira secundária na cabine, pode interromper tal ataque em meio a uma abordagem complexa e multifacetada para a segurança da aviação”, afirma o Projeto de Lei. “No entanto, a FAA concluiu que, se as barreiras secundárias na cabine forem completamente eficazes para impedir ataques, instalá-las seria economicamente viável, assumindo que a probabilidade de uma tentativa de ataque terrorista seja de pelo menos 0,66% ao ano, ou aproximadamente uma tentativa dessa magnitude a cada 150 anos”. 

Thurber citou no artigo evento recente (em fevereiro passado) envolvendo um Airbus A321 da Lufthansa, da incapacitação de um copiloto na ausência de outro tripulante na cabine, quando o comandante deixara a cabine para ir ao banheiro, por um período de 10 minutos, durante fase de cruzeiro, com aeronave operando no piloto-automático.

No dia 17 de fevereiro, o Airbus A321-200 matrícula D-AISO, da Lufthansa, realizando o vôo LH-1140 – de Frankfurt/Main (Alemanha) para Sevilha (Espanha) -, 205 ocupantes (sendo 199 passageiros e 6 tripulantes), estava em rota no FL350, a cerca de 40 milhas náuticas a sul-sudoeste de Madri (Espanha), quando a tripulação solicitou o desvio urgente para Madri, informando que o copiloto não estava se sentindo bem. A aeronave fez retorno e pousou em segurança em Madri cerca de 18 minutos depois.

A aeronave permaneceu em solo em Madri por cerca de 5,5 horas, prosseguiu a viagem e chegou a Sevilha com um atraso de aproximadamente 5,5 horas.

Em 11 de abril, o CIAIAC (autoridade de investigação de acidentes/incidentes aeronáuticos espanhola) informou que o comandante deixou a cabine de comando e, posteriormente, o copiloto ficou incapacitado. O comandante acessou a cabine de comando e decidiu desviar a aeronave para Madri. O CIAIAC abriu uma investigação sobre a ocorrência, classificando-a como um incidente.

Em 15 de maio, o CIAIAC espanhol divulgou relatório final, concluindo que a causa provável do incidente foi incapacitação do copiloto pela manifestação de um sintoma de uma condição que não detectada anteriormente pelo próprio tripulante ou durante o exame médico aeronáutico.

O CIAIAC listou as seguintes constatações:
– o copiloto possuía um certificado médico de Classe 1 válido, sem limitações.
– durante a fase de cruzeiro, o comandante deixou a cabine de comando por razões fisiológicas.
– pouco antes, os dois pilotos conversaram sobre as condições meteorológicas e a operação da aeronave sem que o comandante percebesse qualquer anormalidade no comportamento do copiloto.
– o copiloto sofreu uma incapacitação súbita e grave enquanto estava sozinho na cabine de comando e não conseguiu alertar o restante da tripulação sobre sua condição.
– durante a incapacitação, o copiloto inadvertidamente operou interruptores e acionou os controles de vôo.
– o piloto-automático e o sistema de propulsão automática permaneceram acionados e a trajetória de vôo foi mantida.
– após o comandante deixar a cabine e o copiloto sofrer a incapacitação súbita e grave, a aeronave continuou a voar por cerca de 10 minutos em fase de cruzeiro com o piloto-automático acionado, mas sem supervisão adicional de nenhum dos pilotos.
– para obter acesso à cabine de comando, o comandante utilizou o código de emergência.
– antes que o tempo limite do código de acesso de emergência expirasse, o copiloto abriu a porta da cabine de comando manualmente por dentro.
– diante da emergência, o comandante decidiu pousar no aeroporto mais próximo. Isso permitiu que o copiloto recebesse atendimento médico o mais rápido possível. [EL]